Wednesday 10 March 2010

Ensaio sobre a Escrita

foto: Simplesmente eu...

"Hoje acordei com um espírito diferente dos outros dias.
Hoje acordei com um espírito que já há muito não possuía..."

Pensei que se tivesse afastado permanentemente sabem? Aquela sensação de que perdemos algo, que nos esquecemos de algo importante embora não tenhamos a mínima pista do que possa ser? Hoje vou tratar toda a gente que aqui leia este texto por tu. Conforta-me saber que estás aí, e não estou a falar para o ar compreendes? 

Decidi escrever um Ensaio que não é um Ensaio, são apenas sentimentos, sobre uma escrita, a minha escrita, que também não sei se se pode considerar uma escrita. 
Sou uma pessoa que tem que estar constantemente a ler ou a escrever, ou a fazer as duas coisas, é assim que sou. Porém, alguns dissabores da vida me levam a acordar em determinados dias (infelizmente tornaram-se a maioria dos dias que vivo) com a tal coisa "desconhecida" perdida. Será que se pode tratar como inspiração? Não faço ideia. Inspiração é apenas um substantivo para designar algo imaterial, por isso nem sequer sei se existe. 
Há pessoas que se sentem livres a praticar desporto, outras que se sentem livres a tocar guitarra ou outro qualquer instrumento, outras que não procuram nada para se sentirem livres pois não querem sentir-se livres, depois há aquelas, como eu, que não são habilidosas para nada em particular. 

Nunca fui um ás no desporto e quem me conhece sabe bem. Não se pode dizer que não goste de desporto, existem alguns desportos que gosto bastante, desportos como, por exemplo patinagem artística. Algo que não seja em equipa, pois, na minha opinião, não precisamos de sentir que somos melhor ou pior do que alguém que joga ao nosso lado, pois acho que praticar algum desporto seria, para mim, ter os meus minutos comigo mesma. Se algum praticante de algum ler isto e discordar profundamente, pode sempre deixar-me um comentário para me iluminar. 

Quanto àquelas pessoas que estão numa banda, ou que tocam a solo, ou até apenas sozinhas em casa, foi algo que sempre admirei e gostaria de fazer. Só me aventurei nas cantorias ainda, pois acho que é para o que tenho mais talento, um pouco de aulas de piano, porém não creio que seja o meu forte. O meu sonho sempre foi a guitarra, por isso admiro imensos guitarristas, pois para mim, aquilo é um esforço sobre-humano. Algo que eu nunca conseguiria fazer. Quando um guitarrista se esforça para fazer aquele ou outro solo, está ele, sozinho, no seu mundo onde só existe a música e a guitarra. Uma palavra: Mágico.
"Então e as pessoas que não possuem qualquer habilidade para nada em particular?" - perguntam vocês. Como eu, por exemplo. Escrevo. Não quero dizer com isto que as pessoas são escritores donos de grandes obras literárias são pessoas sem habilidades especiais. Não posso crer. Penso que há pessoas que vivem com esse talento inato. Que é parte deles, é tão natural como beber água. Falo sim por mim. Escrever para mim representa descobrir uma parte da minha personalidade que está escondida aos olhares e percepções da grande maioria das pessoas. Quando escrevo sou eu mesma e ao mesmo tempo sou alguém que nem sei se existe, que pode ser, muito bem, imaginária. Posso ser louca, um boémio embriagado, posso ser alguém influenciada por narcóticos, ou apenas uma princesa inocente e conservadora: A escrita é assim mesmo. Podemos descer do píncaro mais alto da lua até à sarjeta mais nojenta e mal frequentada de qualquer lugar que ninguém sabe onde se encontra e não passa de mais outra sarjeta de mais uma cidade invisível, que, ao fim e ao cabo o somos todos. 
Quando escrevo na maior parte das vezes oiço apenas uma música, em modo repetitivo. Estranho não é? Porém assim não tenho que me desconcentrar para por exemplo, passar determinada música que não quero ouvir ou pensar o que irei ouvir seguidamente. Alguns de vocês podem já estar a pensar "Mas ela é louca?"

Portanto digo-vos, é a tal parte de loucura que tenho quando estou a escrever. Como um sabor quase compulsivo do que estou a tentar fazer, tenho um pouco de obsessão com as letras devo confessar. Já li dicionários, todos do início ao fim, perco a conta a todos os livros que já li, desde uma literatura mais leve à clássica, passando por romances ou literatura infantil-juvenil, eu simplesmente gosto de ler tudo porque me revejo em várias coisas, tal como necessito de me rever em várias coisas para escrever algo que considere meu.

Quando escrevo sinto que estou a fazer uma revolução violenta de espada em riste e palavrões preparados contra o meu inimigo imaginário, porém o ambiente ao meu redor continua a permanecer inalterado e estático... calmo. Como poderei eu estar a fazer uma revolução então? Penso que seja interior. Sinto que sou rebelde, como um boémio típico de séc. XVIII em Paris, viciado em Ópio e Absinto, contra o regime absoluto e crente na "Liberté, Égalité et Fraternité".  

Posto isto, por vezes sinto-me degradante, como alguém que é dependente de algo. Como sou, quando recupero a "inspiração" (vamos chama-la assim) fico quase sempre dependente de escrever e tenho mesmo que escrever senão o meu estado de espírito recusa-se a cooperar com o que quer que seja. Como um viciado em narcóticos, por exemplo, que não pode ter a sua dose de fantasia diária. É como se todos os músculos que tenho no corpo gritassem de dor e me pedissem para parar e escrever, para lhes injectar a fantasia que tanto anseiam para voltarem a comportar-se normalmente, é assim que funciona a minha mente quando têm falta de escrita.

Quando me sento para escrever por vezes gosto de olhar para aquele lado mais cor-de-rosa da vida, com rosas, príncipes bonitos em cavalos brancos que me virão salvar, sinto-me como uma princesa com um lindo vestido cor-de-rosa, delicado, sinto-me num quarto lindo, delicado, digno de uma princesa como eu e acredito. Acredito nos sonhos que temos, acredito no amor, acredito que ainda há doçura e beleza suficientes no mundo para me acalentar o coração. Acredito que o mundo é belo e inocente, como a princesa que há dentro de mim é, como tudo pode ser como nos contos de fadas que tanto aprecio desde tenra idade.
"Como podes ser isto ou aquilo se não és nenhum deles?" Perguntam agora vocês. A resposta é a mais simples que podem (ou não) imaginar: Simplesmente, Sendo. Tu também podes ser, porque não experimentas? 
Gostaria que toda a gente que conheço se sentasse e fingisse ser alguém ou algo e escrevesse desse ponto de vista, para podermos ver quantos pontos de vista podemos ter sendo a mesma pessoa ou pensando da mesma maneira e no entanto sermos tantas coisas ao mesmo tempo e pensarmos todos qual árvore, com mil e uma ramificações e direcções diferentes, porém todos para um bem comum, com o mesmo objectivo: Crescer. Crescer como indivíduos, como grupo, como um todo. 

Com isto tudo, intencionava expor o que significa para mim o acto de escrever, porém sinto que deixei algumas pontas soltas e aqui nasce a frustração enquanto escritora, aquilo que me motiva para andar em frente e escrever cada vez mais, com o objectivo de no futuro deixar cada vez menos as mencionadas "pontas soltas". Todavia, quando falamos de sentimentos de um ser humano como qualquer outro revela-se sempre difícil não deixar algo para trás pois é mesmo assim que são os nossos sentimentos: Algo difícil de por em palavras pois estas às vezes não são suficientes, não são suficientemente acertas, é neste patamar que se pode, digamos, "calcular" o talento inato do escritor, a maneira como selecciona cuidadosamente as palavras para estas serem o mais acertadas possível, encontrar a tal expressão que nos acalma a alma e nos diz que era isto exactamente que desejávamos transpor para os outros que têm paciência suficiente para nos seguirem teriam que ler para compreender o núcleo do sentimento ou sensação que queríamos transpor. Por isso, para mim escrever é como um exercício físico, pois temos de treinar os nossos músculos para aguentar certos e determinados exercícios, tal como temos de treinar a nossa mente e capacidade de escolha e torná-las o mais aprazível que podemos à leitura, seja ou não publicado o texto, na minha opinião tem que ser obrigatoriamente uma leitura agradável nem que seja apenas para quem a escreveu. 

Sempre que leio o que escrevo detecto sempre algo que poderia ser melhorado, considerando ou não um erro, há sempre algo que poderia ter saído, como hei-de dizer... Melhor. Ter chegado mais longe, ter ultrapassado a meta desta corrida cansativa e continuar a correr em vez de parar e dar descanso ao corpo. Continuar a correr livre, sem ter uma meta, correr e observar a paisagem, a vida dos outros, e correr até o corpo gritar e revoltar-se e cair de dor no chão, impossibilitando de levantar e continuar, só aí fica a mente descansada. Fiz até poder. Fiz até não poder mais. Consegui ultrapassar a meta imaginária que tinha traçado para este texto. Expremê-lo ao máximo e recolher todo o seu elixir maravilhoso depois de uma corrida com a sede a atormentar, para quando findar poder bebê-lo, com finalidade de saciar toda a sede que tinha por fazer algo assim, até quando acabo de o "beber", fico descansada e orgulhosa. Passado algum tempo começa de novo a fazer-se sentir a sede sacrificante que nos obriga de novo a correr que nem loucos para a saciar, e assim se renova sempre a minha urgência sempre presente de escrever, de ser reconhecida pelo menos por isto, por ser algo que sou ou por ser algo que poderia ser, ou até por ser algo apenas imaginário, não interessa, não há metas, há sim objectivos, e para um escritor não existe um FIM concreto para o que quer que seja.

"Está quase lá, preciso apenas de mais uma palavra... Tenho de procurar e encontrá-la o mais depressa possível para poder seguir em frente com o meu objectivo, deixa-me ser tudo o que posso ser e o que não posso ser, deixa-me ser étera, deixa-me ser apenas uma Imaginação... Deixa-me ser Livre..."   
 
Será que consigo dar este texto como terminado hoje? Claro que não. Conheço-me infelizmente e sei que vou desenvolver mais sobre este tema. Ou talvez não. Não sei pois quando escrevo sou vários personagens, cada um mais improvável que o outro e sinceramente não sei se eles irão voltar outra vez algum dia. Talvez sim. Talvez não. Só o futuro dirá, contudo o meu objectivo não está pronto por aqui, pode temporariamente saciar-me a sede deste tipo de escrita porém sei que é apenas um estado de espírito temporário. O futuro é incerto porém avizinha-se algo grande, posso senti-lo, e sentir que sou útil e vou ter a minha parte em algo desta dimensão faz-me querer gritar ao mundo tudo o que sou e posso ser pois finalmente apercebi-me que posso não ter nenhuma habilidade em particular mas que estou a aproximar-me de algo que pensei que nunca iria conseguir fazer e estou a conseguir, ultrapassado todos os obstáculos. "Vai tudo correr bem, vais conseguir..." segreda-me um pequeno passarinho azul. "Eu sei!" Respondo eu com toda a certeza do mundo. 

"Eu sei que vai... Pois juntos somos aquela tal árvore, todos os ramos são distintos porém todos desejam alcançar o céu, sempre juntos a crescer na mesma direcção... Fazemos parte de um todo e esse todo faz parte de nós... Eternamente. Amo-vos..." 
 
 
Mata ne!

3 comments:

  1. That's some deep shit, man!

    Não a sério, hoje tenho muito que comentar.
    1º : Discordo brutalmente quando dizes que não tens uma habilidade específica. Tu ou qualquer pessoa TEM!
    Caímos no erro de achar apenas os musicos, os actores, os desportistas ou qualquer outra actividade digna de enfâse (que na minha opinião está errado) tem talento para algo. Mentira.

    Há pessoas peritas em mudar pneus, a cozinhar, a coser, a construir casas, a varrer as ruas, a conversar, ou qualquer outra coisa por mais random e disparatada que te possa parecer.

    Tu também tens um ou mais talentos, não os viste ainda porque tu tentas exportar uma parte de ti, que gostas e queres ser, para fora do teu ser.

    "Gostaria que toda a gente que conheço se sentasse e fingisse ser alguém ou algo"

    Não devemos fingir mas expandir. Cria uma extensão de ti mesma, ama te, conhece te e projecta te nas mais variadas formas.

    Não prendas a tua alma e a sua essência ao palpavel e ao que os outros (julgam que) veem.

    Foi algo que aprendi a ser: livre.
    Livre para fazer, comportar-me, dizer
    , pensar o que bem entender sem me prender aquilo que acho que (estritamente) sou.

    Porque se hoje sou uma princesa e amanha uma bruxa, sou sempre EU na mesma.
    E partir daí vais conhecer te muito melhor e descobrir aquilo por que tanto anseias.





    Bem eu nao sou nenhuma psicóloga nem nada do género, mas era precisamente isto que queria comentar. Longe de te querer dar lições de vida/moral, acho que é sempre positivo sabermos outra visão e ainda por cima tão próxima <33

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  2. Todos temos uma especialidade, talvez ainda não tenhas descoberto a tua mas garanto-te que a tens. Nem que seja algo que ainda não exploras-te, que ainda não contemplas-te por estares embrenhada em outros assuntos, outros a fazeres. Temos que ser quem somos todos os dias, vistamos a personagem que vistamos a personagem que vestirmos, como disse a outra pessoa que comentou.

    Boa sorte na procura.

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  3. A Sociedade tornou-se de tal forma complexa que hoje temos dificuldade em sabermos qual a nossa especialidade, o que gostamos de fazer ou o "que queremos ser". Posso estar enganado mas penso que nos tempos mais remotos a sociedade estava mais bem estruturadas neste aspecto. Havia os ferreiros, os droidas, os guerreiros, os agricultores, os sapateiros, ... e não existia desemprego. Haveria talvez algumas pessoas que preferiam viver da mendigagem. Hoje a sociedade não prepara os jovens para o mundo do trabalho e o mundo do trabalho não esta preparado para eles. Maeve se tu tinhas boas notas no secundário, se sempre foste mais inteligente que os outros miudos, se conheces musicas desconhecidas para a maioria, se conheces as palavras mais escondidas do dicionario, se aprendes linguas facilmente, .... então não podes ser uma inútil

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